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Os igarapés que cortam Manaus

Por Paulo Almeida Filho

18 de abril de 2023 às 11:32 Compartilhe

Manaus está dividida em quatro Bacias Urbanas, sendo a Bacia de Educando, cujo principal contribuinte é o Igarapé do Quarenta, Bacia do São Raimundo, principal contribuinte é o Igarapé do Mindu, Bacia do Puraquequara e Bacia do Tarumã.

A cidade de Manaus, localizada na Amazônia Central, representa atualmente uma Metrópole em expansão em meio à biodiversidade da maior floresta tropical do planeta Terra. A abundância e a alta densidade hídrica da região, são elementos que refletem a natureza presente e viva, mediante o caos que se constrói frente à elevada demanda de serviços e infraestrutura urbana, gerada nesta metrópole.

A superfície de Manaus é recortada por cerca de mil (1.000) igarapés, que compõem um conjunto hidrográfico formando grandes bacias urbanas como o Mindu e o Quarenta — que se encontram em alto estágio de contaminação — no entanto, ainda é possível encontrar algumas nascentes em estado de preservação. Além dessas bacias, os igarapés Puraquequara e Tarumã-Açu delimitam os setores Leste e Oeste da cidade.

A expansão da metrópole, junto ao crescimento populacional ocorreu de maneira intensa, evidenciando-se por uma elevada densidade demográfica de aproximadamente 191,44 hab./km²,
para uma população estimada em 2019 de 2.182.763 pessoas.

Mediante esse crescimento, o estado tende a enfrentar dificuldade de lidar de forma coerente com este fenômeno. Dentre as principais causas da contaminação dos rios, podemos citar a essencial falta de um plano de saneamento básico.

A estratégia do governo em tentar minimizar a expansão desordenada da cidade, foi construir conjuntos habitacionais desconsiderando os trechos de rio ali presentes. O escoamento superficial da cidade direciona-se essencialmente aos rios carreando grande quantidade de resíduos sólidos flutuantes como garrafas pet. No processo de construção da educação ambiental, alguns cidadãos e grupos de interesse, dedicam-se a minimizar esse desgaste ambiental que nós mesmos causamos. No extremo oeste da cidade de Manaus, a bacia do igarapé Tarumã-Açu, diferentemente da grande maioria, ainda se encontra em bom estado de preservação hídrica.

Isso quer dizer que a balneabilidade, o lazer, o turismo e outros usos ainda perfeitamente possíveis nesta bacia. Neste contexto, motivados pela intensidade destes usos, alguns pesquisadores já começam a realizar testes de IQA (Índice de Qualidade da Água) que mostram superficialmente algumas alterações na qualidade da água em seu trecho mais urbano. A bacia hidrográfica do Tarumã-Açu abriga uma mescla de ocupações sociais distintas.

Em seu baixo curso, predominam as ocupações da alta classe social, intensa verticalização e  valorização paisagísticas e turísticas. Em seu médio curso, encontram-se aglomerações subnormais, bairros oriundos de uma expansão desordenada, e assentamentos indígenas que expressam extremo descaso. Em seu alto curso, temos uma ambientação mais rural ocupada
por sítios e fazendas. No entanto a industrialização também é presente neste trecho.

A proposta de criar um Comitê de Bacia Hidrográfica para um rio da Amazônia se tornou um desafio, visto que o Comitê propõe a conciliação dos usos diante da escassez de água. Na região de Manaus, em relação aos corpos hídricos, a questão se coloca diante da qualidade de tanta água presente em apenas um território. A funcionalidade e a dinâmica de um Comitê se tornam cada vez mais dificultosas ao consideramos que, a predominância e participação neste colegiado vem essencialmente daqueles que possuem interesse pelo funcionamento da natureza atrelado ao capitalismo econômico.

O Comitê é um colegiado que traça seus objetivos a partir da implantação políticas públicas de recursos hídricos, principalmente através da Lei Nacional 9.433, a Lei das Águas. Muitas diretrizes destas politicas se colocam de forma genérica a todo país desconsiderando as peculiaridades naturais de cada ecossistema de nosso território nacional. A princípio precisamos considerar a natureza em primeiro lugar. ―Os habitantes das cidades devem entender e assumir que a água, por exemplo, não vem dos supermercados ou da torneira.‖ Considerar que a natureza também tem seus limites e que nem sempre estará a nosso devido dispor, é ter respeito ao que rege a consciência ecológica.

Todos os igarapés que cortam a cidade de Manaus estão poluídos, diz pesquisador. Informação foi dada durante o simpósio ‘’Igarapés de Manaus e Saneamento: Cenários e Perspectivas’’; evento expôs mais uma vez o estado lastimável em que se encontram nossos cursos de água.

 

“Antes usados para lazer, navegação e pesca hoje quase todos os 150 igarapés da capital amazonense estão poluídos com lixo e outros rejeitos.‖ Artigo escrito pela Comunicadora Popular Kamila Cunha de Albuquerque”.

Algumas nascentes estão protegidas, mas não tem um igarapé que corta a cidade de Manaus que não esteja contaminado. Mas a situação pode ser revertida, com investimento em saneamento básico e educação ambiental. Quem afirma é o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Sergio Bringel, um dos palestrantes do simpósio ―Igarapés de Manaus e Saneamento: Cenários e Perspectivas‖, realizado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-AM).

Para ele, fazer o tratamento adequado do esgoto, revitalizar – da nascente para a foz – e proteger os igarapés seria a solução para mudar o cenário dos nossos igarapés. ―Saneamento não é gasto. É investimento. Se US$ 1 que você investe em saneamento, economiza US$ 7 na saúde, é viável ou não é? Outra coisa, todo esgoto pode ser reaproveitado. Pode fazer adubo e o líquido usar na irrigação. O Amazonas não tem fertilizante, mas a gente está jogando fora toneladas e gastando em saúde o que não era para ser gasto‖, disse Bringel.

O pesquisador destacou que a capital só tem aproximadamente 10% de tratamento de esgoto e o que é coletado é lançado in natura na orla da cidade, o que contribui para a poluição dessas águas. ―São lançadas no rio toneladas de excremento humano. Para que essa matéria orgânica seja oxidada ela vai consumir o oxigênio dissolvido, contido na água, a água ficando sem oxigênio vai ter mortalidade de peixe. E quando esse excremento não é tratado vêm junto com ele bactérias, fungos, protozoários, entre outros, então começa a aparecer as doenças‖.

Ele lembra que crianças estão morrendo em Manaus com doenças de terceiro mundo por falta de saneamento básico. ―O genes circulares vírus é um deles que está matando. É característico de países de terceiro mundo que não tem saneamento básico. Isso mostra que nós não temos saneamento. Coletar esgoto e jogar no rio não é saneamento básico.

Saneamento básico tem que ter coleta, tratamento e descarte final, não tem tratamento, estão jogando no rio Negro para que ele possa fazer o tratamento‖.

O catraieiro Vanildo Andrade da Costa, 70 anos, chegou a passear pelo igarapé do São Raimundo quando a água era limpa. Hoje, ele ainda faz esse trajeto, mas lamenta o que encontra pela frente, tudo quanto é tipo de resíduos sólidos. ―Na época da vazante é pior porque aparece mais lixo e a água fica com um odor muito forte devido à sujeira‖, afirmou. ―E este ano foi o ano que mais jogaram cadáver dentro do igarapé. Até ajudei a rebocar um defunto para a margem para o IML (Instituto de Medicina Legal) remover‖.

Para Sergio Bringel, todos têm certa responsabilidade pela atual situação dos igarapés de Manaus. As pessoas por fazer suas necessidades e jogar no igarapé, o poder público por não punir e deixar que elas façam isso e porque não dá educação adequada. ―Tudo se resume numa palavra: educação‖.

Quem vê os igarapés de Manaus nos dias de hoje, não consegue imaginar que eles já foram sinônimo de diversão para as gerações mais antigas da cidade.

Aos 59 anos de idade, o universitário Hildemar Souza lembra com carinho do tempo em que seu programa aos fins de semana era pegar carona em um caminhão e sair de sua casa, no Centro
de Manaus, em direção a um balneário na atual Avenida Ephigênio Salles, na Zona Centro-Sul da cidade. “Antigamente tínhamos muita dificuldade de nos locomover em Manaus. As famílias que tinham mais recursos iam para os balneários de carro. Já a gente pegava um caminhão onde ficava o Cine Guarany e íamos para um banho chamado Muruama, no V8. Lá passávamos a manhã toda”, conta.

Nostálgico, Hildemar afirma que as águas dos igarapés da cidade eram “tão limpas que você poderia jogar uma aliança neles e iria enxergá-la”. Os balneários foram aproveitados por ele desde a infância até a idade adulta. “Com uns 30 anos ainda fui tomar banho no Tarumã, quando ainda dava para fazer isso. Lembro que lá tinha uma cachoeira com uma gruta. Era lindo”, comenta.
A chamada “alta sociedade” também gostava de ir aos balneários de Manaus.

Assim como Hildemar, a técnica em enfermagem Márcia Rates, 45 anos, também sente saudades de frequentar os igarapés da cidade. “Costumava combinar com as minhas amigas de ir até a Ponte da Bolívia [Zona Oeste da capital amazonense]. Na época, eu já tinha minha filha, mas não a levava porque tinha medo. Isso tem mais de 30 anos e era completamente diferente do que é
hoje”, compara.

O historiador Otoni Mesquita comenta essa “diferença” pontuada pela técnica em enfermagem. “Para falar dos igarapés de Manaus teríamos que voltar mais ainda no tempo, do século 21 para o 19. Naquele contexto, teríamos que considerar que aquela era uma outra cidade.

Não havia automóvel, apenas carroças. O ritmo da população era outro, as necessidades também e o igarapé era um elemento fundamental para a vida das pessoas”, resume.

Segundo Otoni, os cursos d’água determinaram a disposição dos bairros e até mesmo a marcação das ruas da cidade. “Eram fundamentais porque tudo girava em torno de uma pergunta:
‘Como eu vou obter água?’. De certa forma, a cidade crescia em um movimento de Leste a Oeste e, a partir do século 20 ela começa a correr do Sul para o Norte”, acrescenta. Essa nova disposição fez com que Manaus “virasse as costas” para os igarapés, conforme o historiador.

Otoni afirma ainda que, a partir daquele momento, o homem começava a se sentir mais autônomo, o que fez com que ele “desprezasse” a natureza”. O curso d’água já não era a coisa mais importante, porque ele acreditava que era capaz de transportar e levar água para qualquer lugar. Só que ele percebeu, aos poucos, que os seus mananciais estavam se perdendo e seus rios se
comprometiam”, explica. “Nós temos ideia que aquela era uma população que talvez não tivesse comprometimento e consciência do valor desse material. Isso é algo que caracteriza ainda hoje o nosso povo. Há um desrespeito muito grande. Mesmo as pessoas que nasceram e viveram na beira dos igarapés tendem a jogar muito lixo no mesmo lugar onde trata o peixe”, critica.

“Falta uma ação para conscientizar de forma mais incisiva o povo. É necessário que essas campanhas não sejam uma coisa meramente burocrática. Uma ação dessas tem que ser liderada por pessoas envolvidas não pela política, mas pelo social”, defende.

Segundo Otoni, a degradação nos igarapés começou em meados da década de 70, quando os balneários ainda eram “febre” na capital amazonense. Até os anos 60, Manaus tinha a alcunha de
“Cidade Flutuante”. O nome foi dado após o declínio da borracha, quando os seringalistas “migraram” para casas construídas em cima dos rios.

Em 1965, o então governador do Amazonas, Artur Reis, deu fim a essa fase de Manaus, conta o historiador. “Com o final da Cidade Flutuante, foram construídos os primeiros conjuntos
habitacionais. Assim, vemos esses mananciais perdendo os igarapés. É uma tristeza pensar nisso porque a Manaus dos anos 60 e 70 era bucólica, maravilhosa com a água pura do igarapé.

Hoje, você vai a qualquer um desses lugares e se entristece com a quantidade de lixo. É uma cidade que tem outras prioridades”, lamenta.

O químico Sérgio Bringel compartilha o pensamento de Otoni. Ele é especialista em Gestão em Recursos Hídricos de Pequenos e Grandes Rios e estuda os cursos d’água amazônicos há quatro
décadas. “Comparar a Manaus da década de 50 com a dos dias de hoje é muito difícil. Saímos de uma população de 250 mil habitantes para uma de 2 milhões. Mesmo com o fim da Cidade Flutuante, os governos continuaram a permitir que houvesse a construção de palafitas nas margens dos igarapés”, afirma.

“É impossível restaurar, mas replantar e repor parte da arborização é algo mais fácil. O Prosamim foi um projeto aprovado com base no comprometimento de recuperação da fonte, então
temos que exigir isso. Nenhum manancial foi recuperado e alguns cursos de igarapés foram perdidos”, concorda Otoni Mesquita.

 

Espero que tenham gostado.
Paulo Almeida Filho – Inativo/Am
FONTE: Wikipédia, Google, FIBGE, jornalacritica, SILANE SOUZA, amazonasatual,

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