A Receita Federal anunciou uma greve por tempo indeterminado, a partir da próxima segunda (4). A informação foi concedida por representantes do Sindifisco (Sindicato dos Auditores da Receita Federal do Brasil), em coletiva de imprensa, realizada nesta quinta (31), na sede do Cieam. Os sindicalistas informam que o movimento visa reivindicar o cumprimento de um acordo firmado com o governo federal em 2017, e até hoje não cumprido. E acrescentam que vieram a público na intenção de sensibilizar a classe empresarial e pedir que esta ajude na intermediação com o governo federal.
Escaldadas em greves anteriores, lideranças classistas ouvidas pela reportagem do Jornal do Commercio já antecipam perdas mais ou menos significativas, dependendo da duração do novo movimento paredista. A expectativa é que, a partir da implantação de uma “operação padrão” – ou “operação tartaruga” – nas alfândegas da Zona Franca de Manaus, os setores comecem a ficar gradualmente sem mercadorias. O primeiro a sofrer seria o PIM, que passaria a se ressentir pela falta de insumos, dado que a indústria incentivada não trabalha com grandes estoques. A próxima vítima seria o comércio.
A greve foi aprovada em assembleia nacional dos auditores, realizada nos dias 21 e 22 de agosto, e visa levar o governo a cumprir integralmente o Plano de Aplicação do Fundaf (Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização), conforme o disposto na Portaria MF Nº 727/2023. “Marcamos uma reunião com a OAB-AM e os representantes empresariais do Cieam e da CDL-Manaus, para comunicar que, a partir desta segunda (4), haverá um movimento paredista na Receita Federal. Foi deliberado, nos dias 21 e 22 de agosto, que iniciaremos uma greve a partir desta data”, anunciou o vice-presidente do Sindifisco, Eduardo Toledo, durante a abertura da coletiva de imprensa no Cieam.
“Sensibilidade maior”
Os representantes do Sindifisco informaram que o governo “está em mora” em relação ao acordo celebrado em 2017, que implicaria também em renúncias salariais anteriores da categoria. De acordo com o representante do Comando de Mobilização em Manaus, Carlos Balter, desde essa época, o Executivo federal vem postergando a solução para esse problema. Mas, a partir de junho deste ano, o acordo foi regulamentado, o que acendeu uma luz de esperança para os auditores. Mas, conforme o dirigente sindical, o horizonte voltou a se fechar, já que o recurso para tanto não integra o Orçamento.
“Nosso acordo não envolve acréscimo de despesas. Estamos pleiteando apenas uma alocação de recursos, conforme combinado. Estamos sensíveis ao momento da sociedade e ao momento orçamentário. É importante que vocês saibam que o fiscal federal hoje é o pior fiscal remunerado do Brasil, em relação a seus pares de qualquer Secretaria de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal. Essa não é uma punição à sociedade. Isso depende de uma decisão política, e esperamos retornar ao nosso trabalho de forma normal e natural”, frisou, acrescentando que o movimento paredista é nacional.
Conforme Carlos Balter, a categoria tem “sensibilidade maior” com a ZFM, que costuma ser mais vulnerável às operações padrão da Receita, por ser uma área de comercio exterior incentivado. “Viemos buscar essas entidades da indústria e do comércio, porque gostaríamos de explicar nossa situação e contar com seu apoio junto ao governo federal em torno de nosso pleito. Nosso sonho é que esse movimento não seja necessário. Vamos ver se temos tempo de sensibilizar o governo para que a greve não aconteça”, explicou, acrescentando que a intenção também é sensibilizar os políticos da região.
O representante do Comando de Mobilização em Manaus frisou ainda que essa parceria não é de mão única. “Diuturnamente a Receita faz o seu trabalho e cumpre sua missão institucional para tornar mais ágeis e céleres os processos que envolvem os empresários. Nosso trabalho é fundamental para separar o joio do trigo, para que o empresário que age conforme a lei, não seja prejudicado pela concorrência predatória”, apontou.
“Prejuízos incalculáveis”
O vice-presidente da ACA, Paulo Couto, assinalou que a greve anuncia “prejuízos incalculáveis” ao comércio. “O setor trabalha com movimento fraco, baixíssima rentabilidade e estoques muito reduzidos. Ficar a mercê de uma elite funcional não agrada àqueles que dão o seu suor para a geração de renda e manutenção dos empregos”, desabafou.
O dirigente lamentou a decisão da categoria. “Se o governo não cumpre o que promete, a sociedade organizada não pode pagar por isso. E também não se pede apoio ameaçando paralisações. Desconheço, ao longo dos anos, esse tipo de comportamento. Seria melhor que fizessem pressão política. Que recorram ao Congresso e aos políticos que fazem parte do relacionamento com a Categoria”, recomendou.
O presidente da FCDL-AM, Ezra Azury, concorda que não seria papel dos empresários intermediar conflitos trabalhistas entre o Executivo federal e os funcionários do setor público, “da mesma maneira que o governo não pode intervir em uma negociação entre os empresários e seus trabalhadores”.
“Vamos torcer para que as partes se entendam e que isso não acarrete em prejuízos para o comércio e para a indústria. Porque a paralisação não afeta apenas esses dois setores, mas também os prestadores de serviços e várias pessoas que dependem do dia a dia dessas atividades, que acabam perdendo. Em uma greve dessas, muito mais pessoas perdem do que ganham”, alertou.
O presidente da CDL-Manaus, Ralph Assayag diz que, se o governo não cumpriu um acordo salarial, está errado. Mas discordou da estratégia dos auditores. “Quando eles estrangulam a população, com falta de produtos, ela fica contra eles. Precisamos que esses reajustes aconteçam, até porque, quanto melhor o salário, mais vai para o comércio. Mas a greve teria de ser feita de uma forma inovadora”, sugeriu.
“Temor e preocupação”
O presidente da Fieam e vice-presidente executivo da CNI, Antonio Silva, salientou que a notícia da greve foi recebida pelo PIM com “temor e preocupação”. Para o dirigente, os impactos da greve, no atual momento, tendem a gerar consequências “altamente prejudiciais” para a atividade econômica em geral e para a indústria em particular.
“O momento atual é de atividade em tendência relativamente estável. Contudo, ela ainda está muito suscetível a ações externas que possam afetar a dinâmica econômica, como é o caso de uma eventual greve. Nossa expectativa é de que esse movimento seja resoluto a fim de causar o mínimo impacto possível sobre a economia local e nacional”, afiançou.
O vice-presidente da Fieam e presidente do Sindicato Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Manaus, Nelson Azevedo, concorda. “Esperamos que o governo dialogue com os auditores da Receita Federal para equacionar as reivindicações e manter a continuidade dos serviços, para que a sociedade não seja penalizada. É preciso bom senso das partes”, finalizou.